segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

É TANTA CRUZ PESADA...

É TANTA CRUZ PESADA...

Em Março de 1983, eu trabalhava numa empresa de autopeças, quando foi admitida uma moça para trabalhar na mesma sala que eu.

Ela era dinâmica e muito inteligente. Havia concluído o curso normal, e seu sonho era estudar pedagogia. Era coisa de vocação mesmo...

Eu da minha vez, mãe solteira e muito coruja, falava muito sobre o meu filho, e do aniversário de um ano dele, que por ser em Junho, já se aproximava.

Ela era alta, tinha uns vinte anos, e usava sempre uma cinta muito apertada, que parecia deixa-la desconfortável e muito nervosa. Mantinha um regime, mas o resultado não fazia jus ao sacrifício. Seu rosto era bonito, e seus cabelos eram curtos e ondulados. Não era gorda... gorda, mas...

Só depois de um mês, foi que ela contou que também era mãe solteira, e seu filho tinha seis meses de idade.

Relatou a seguinte história:

Era noiva de um rapaz por quem era muito apaixonada. Tinha o plano de se casar, só depois que tivesse passado no vestibular. Porém, ao se engravidar antes disso, eles marcaram a data para quando ela ainda estivesse no terceiro mês de gestação, para que o vestido de noiva ainda lhe caísse bem.

A família dele morava no interior de Minas. Num fim de semana os dois viajaram pra lá, levando convites para os amigos e parentes.

Logo que desembarcaram na rodoviária, ele avistou seu primo na porta do bar da esquina, brigando com outro rapaz. Eles aceleraram os passos. O noivo dela foi apartar a briga, quando levou um tiro e já caiu morto.

Filha única, ela sempre foi muito mimada pelos seus pais pobres e trabalhadores, que faziam de tudo para que nada lhe faltasse.

A sua vida virou um pesadelo.

Ela disse que quando a criança nasceu, o bercinho ficava ao lado da sua cama. Algumas noites depois, bastava o filho adormecer e ela se acomodar, barulhos repetidos aconteciam na madeira do berço. Logo em seguida, ela sentia o cheiro do seu amado. Sentia a presença dele ali...

Ao contar para a família, muitos a levaram em diversos templos, para que aquela manifestação parasse. Nada mudou!

Apesar dela não ter medo, aquilo tudo a deixava agoniada.

Numa noite, depois do barulho e do cheiro, ela viu o seu noivo nitidamente em pé ao lado do berço, contemplando a criança. Sentiu medo, calafrios, arrepios! Tentou gritar, mas a voz não saia. Não conseguia se mexer. Parecia congelada.

A única coisa que conseguiu foi fechar os olhos. Em pensamento ela suplicou que Deus o levasse dali. Ela são saberia e não queria conviver com aquilo.

Depois de muitos minutos ela abriu os olhos, e ele não estava mais lá. Rapidamente ela se levantou, carregou seu filho, e levou-o para o quarto dos avós. Os dois, abismados com o acontecido, levaram até o berço para o quarto deles. Desde então, ela não teve a coragem de dormir no mesmo quarto do bebê.

No quarto dos avós, nenhuma manifestação foi observada.

Vez ou outra ela ouvia barulhos indecifráveis no seu próprio quarto, mas deixava pra lá, porque comparados ao fato daquela aparição, isso virou “café pequeno”.

Naquela empresa ela trabalhou durante poucos meses, e depois demitiu-se.

Nunca mais eu soube dela. Porém há uns dez anos atrás, eu assistia o jornal local da Globo, e o assunto era “obesidade mórbida”. Mostraram um guindaste quebrando a parede de uma casa. Em seguida entrevistaram uma moça sentada no chão, cujo peso era 280 kg, porque ela havia conseguido através do SUS, uma operação de redução do estômago.

Era ela. Apesar da gordura, seu rosto permanecia igual. Sem nenhum constrangimento ela respondia todas as perguntas, mostrando-se alegre por ter conseguido tal assistência.

Fiquei surpresa, e li o nome dela logo abaixo da sua imagem.

Aí então, o guindaste tirou-a do chão, levando-a para o hospital.

(27/12/2010)

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

PARECE MENTIRA

PARECE MENTIRA

No único pensionato confortável que morei, tive uma colega de quarto muito engraçada. Seu nome parecia japonês, embora não fosse descendente.

Suaminy tinha dezenove anos, era muito alta e magra. Era despojada e alegre. Extrovertida mesmo. Tudo que falava, era com um largo sorriso no rosto, mesmo quando o assunto era sério.

Quem a levou para esse pensionato foi o seu pai, porque a mãe dela não a suportava. Brigava constantemente com ela. Julgava-a leviana, porque ela gostava de frequentar barzinhos, nos fins de semana. Ela não trabalhava fora, e sua família era de classe média.

O pai só tomou essa iniciativa, porque numa noite quando ela chegou da rua, a mãe quis bater nela, dizendo que, com certeza, ela já teria perdido a virgindade. Disse que na manhã seguinte a levaria numa ginecologista, e provaria isso para todos.

No outro dia, antes que ela se levantasse, o pai da Suaminy levou-a para esse pensionato, protegendo-a.

Ele era equilibrado, e grande amigo de sua filha.

Depois de contar sua história, ela disse que realmente era virgem, e só deixaria de ser, quando amasse alguém. Um ex-namorado que morava perto da casa dela, continuava apaixonado, enquanto ela tinha o coração livre e solto.

Como havia saído apressadamente, ela não teve tempo de pegar as suas roupas. As nossas não lhe serviam, porque ela era muito alta. Inclusive muito bonita, também.

Num sábado à tarde, ela foi na companhia do pai, buscar sua bagagem. Chegando lá, não encontrou a mãe, porque ela tinha ido visitar um parente, e só voltaria dois dias depois.

Suaminy aproveitou para dormir lá nessa noite. Seu ex , ao vê-la chegar, ficou sem sossego. Por volta das 20hs, ele bateu na porta, pedindo para reatarem o namoro.

Ficaram conversando em pé, na varanda da casa. Cheio de saudades, ele não poupou carícias. Então, houve muitos abraços e beijos.

No dia seguinte ela chegou no pensionato, quando eu me preparava para ir para o trabalho.

Com seu jeito brincalhão, ela me disse assim:___Ontem, eu e meu ex nos abraçamos tanto, que, quando entrei em casa, minha perna estava toda molhada. Eu não senti nada diferente...Mas então, quer dizer que eu gozei?

Eu comecei a rir, e disse que não sabia. Ela contou sobre o amasso, sorrindo contente ao se sentir mais adulta, e se deitou na cama. Mais uma vez ela reafirmou: __Eu não senti nada de nada... Também, eu nunca fui apaixonada por ele...

Os dias foram se passando e ela não voltou na sua casa, e nem se encontrou com esse rapaz novamente.

Ela comentou que estava tendo umas tonteiras. Telefonou para seu pai, que a levou ao médico. Foi confirmado que ela estava grávida de um mês.

Grávida, e virgem. Para ela, aquilo tudo parecia uma festa. A menina ria muito, ao dizer que no hospital, ela tinha virado a atração de todos. Ninguém nunca tinha visto algo parecido.

Ela não perdeu a oportunidade e pediu ao médico um atestado da virgindade. Disse que imaginava a cara da sua mãe, depois dessa prova.

O médico disse que seu parto seria cesária, para lhe preservar.

Seu pai a acompanhava nas consultas do pré-natal, e alugou um pequeno apartamento para que ela passasse a gravidez num lugar mais tranquilo. Ele estava sempre presente.

Algumas vezes eu fui visita-la, e ela parecia outra pessoa. A paz no seu jeito de agir era muito diferente daquela menina inquieta e que falava demais.

Ela me apresentou as suas plantinhas, pelo nome que havia colocado nelas. Todas tinham nome de gente. Ao rega-las, ela conversava com cada uma, de um jeito angelical e emocionante.

Numa das vezes que fui lá, ela me contou muito feliz, que ao aproximar a data do nascimento da criança, ela voltaria para casa. A sua mãe havia se rendido ao fato, e foi iniciativa dela, que todos deveriam morar juntos outra vez.

O pai da criança queria se casar, mas ela recusou.

(22/12/2010)

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

SABER O PORQUÊ, PRA QUÊ?


SABER O PORQUÊ, PRA QUÊ?

Faltava um dia para o dia dos namorados. Eu tinha dezessete anos, e havíamos nos mudado para aquele bairro, recentemente. Também era recente, a nossa vinda para Belo Horizonte.

Ao anoitecer, eu e minha irmã saímos pelas redondezas, para conhecermos o lugar. Na volta, quase chegando ao nosso portão, um lindo rapaz aproximou-se.

Ele era muito alto, magro, e usava calça social preta, e uma blusa amarela “Dr. Givago”. Meu coração bateu mais forte. Ele disse que morava na outra rua. Com muita educação e sem tirar os olhos de mim, perguntou se podia namorar comigo. Comentou também, que não ficaríamos sós, no dia dos namorados.

Eu disse que sim; e marcamos para o dia seguinte, nos encontrarmos naquele portão. Entrei em casa e falei para a minha mãe.

Cuidei dos cabelos, lavei meu rosto com bicarbonato, coloquei uma roupa bonita que havíamos ganhado da amiga de infância do meu pai. Ela morara no Rio de Janeiro, e sabendo da nossa necessidade, enviou através do correio, roupas usadas e bonitas, que salvaram aquele momento em que saíamos muito, à procura de emprego.

Aquele belo rapaz elegante chegou no horário marcado. Depois de beijar a minha mão, nós nos sentamos ali, ao lado. Ele estava perfumado... Com alegria no rosto, ele me deu um presente. Era uma pequena réplica de um poste colonial no formato de “T”, com duas luminárias, uma de cada lado, e dentro delas havia um perfume gostoso. O líquido amarelado fazia parecer que elas estavam acesas.

Nossa... eu merecia aquilo tudo?

Eu nunca havia namorado antes. Tinha vergonha de ficar de mãos dadas. Eu não sabia nada de nada. Era inocente como uma criança.

Num sábado, depois dele se despedir de mim, entrei em casa, quando minha mãe disse que não queria saber mais daquele namoro. Ele tinha vinte e um anos, e minha mãe disse que ele era malandro, porque não tinha um emprego.

Eu chorava enquanto ela ditava as suas ordens. À mim, restava apenas obedecer ou obedecer. Ela falou que quando eu fizesse dezoito anos, ela permitiria.

Na noite seguinte quando ele chegou, eu lhe dei o recado. Ele se despediu de mim, e foi embora com o semblante sério e triste.

Eu tinha tanto medo da minha mãe, que daria a vida para não enfrenta-la. Ela tinha a mania de dizer, que quando eu fizesse dezoito anos, eu poderia sair de casa, porque eu já seria “de maior”. Eu sempre ouvia isso sem motivo algum, e sem entender nada.

O tempo foi se passando, sem que eu visse o meu amado. Porém, ele fez várias serenatas pra mim, no meio das madrugadas.

Logo que fiz dezoito anos, ele voltou lá e então reiniciamos o nosso namoro. Havia dois meses que eu tinha sido admitida na Telemig. Quando minha mãe viu a minha carteira assinada, disse que daquele dia em diante, o aluguel de onde morávamos, era responsabilidade só minha. Concordei e fiquei com essa obrigação.

Ela brigava comigo todos os dias. Quando eu chegava do trabalho ela ficava nervosa, e começava a me ofender, mostrando raiva de precisar do meu dinheiro para aquele aluguel.

Namorei poucos meses, mas ela proibiu novamente, dizendo que ele tinha um irmão que não valia de nada, etc... etc.

Eu que sempre fui obediente, terminei o namoro com Ronaldo, e minha terapia era o trabalho. Mesmo assim, ela promovia brigas intermináveis, colocando minhas irmãs mais velhas também contra mim, parecendo uma disputa política. As três juntas sempre me tocavam de casa. A frase da minha mãe: “A porta da rua é a serventia da casa”, martelava na minha cabeça, enquanto eu tentava encontrar uma explicação para tudo isso. A única conclusão que cheguei foi a de que eu havia nascido no ninho errado.

Durante esse tempo eu tinha um namorico aqui, outro ali, o que me fazia lembrar dele ainda mais. Ronaldo... Ronaldo!!!

Eu não o via. Ele era o filho caçula de uma família numerosa. Morava sozinho com a mãe, porque o pai já havia morrido, e cada irmão já tinha sua própria família.

Quando sua mãe morreu, ele se mudou dali, mas eu nunca soube de nenhuma notícia, porque não perguntava pra ninguém. Afinal, obediência é obediência... Perto ou longe da mamãe.

Depois que saí da Telemig e fui trabalhar numa contabilidade, eu fazia hora extra até altas horas, e ainda levava serviço pra casa. Livros para serem lançados até a última página, usando caneta tinteiro.

Num dia, eu cheguei um pouco mais cedo, e minha mãe aproximou-se de mim, meio sem graça, e disse assim: __Eu pensei bastante, e se você quiser voltar a namorar o Ronaldo, agora eu deixo.

Eu não sabia o que dizer, porque há vários anos, eu não sabia nada sobre ele, apesar dele morar no meu coração.

O engraçado disso tudo, é que; alguns dias depois, eu resolvi almoçar em casa, o que não era comum. Eu vivia de dieta, e ficava o dia todo dentro do escritório. Mas nessa quinta feira eu fui em casa às 11:hs. Por volta do meio dia, voltando para o trabalho, eu entrei no lotação e fiquei em pé. Alguém tocou o meu ombro. Ao virar, dei de cara com o Ronaldo. Ele, todo sorridente, perguntou como eu estava, e deu-me um papel com o número do telefone do seu serviço.

Ele estava trabalhando na Prefeitura de BH. Para minha alegria, ele disse que eu o esperasse no portão, sábado às 8 da noite, como nos velhos tempos.

Eu cheguei no escritório e contei para minhas colegas. Não me continha de tanta felicidade. Já que íamos nos encontrar dois dias depois, não era preciso eu telefonar para o serviço dele, incomodando-o no seu local de trabalho.

À noite, eu contei para a minha mãe. Ela estava meio sonsa, e nem sei o que ela falou, porque foi apenas um resmungo.

Chegou o bendito sábado. Eu passei o dia me cuidando, para ficar bonita na hora que ele chegasse. O dia pareceu-me tão longo...

Anoiteceu. Às oito horas eu fui para o portão. Fiquei ali, olhando de um lado para o outro, porque não sabia de qual lado ele viria.

O tempo foi passando e nada... Eu fui ficando agoniada, e senti um aperto no peito. Já eram nove horas. Entrei em casa chorando um choro que era maior que a minha garganta. Chorei horas e horas...

Eu teria que esperar a segunda-feira, para telefonar para o trabalho dele. Meu domingo foi um pesadelo.

Na segunda-feira, cheguei apressadamente na contabilidade, e enquanto me sentava, disquei o número que ele me deu.

Do outro lado, uma voz masculina perguntou com quem eu queria falar. Eu respondi: Com o Ronaldo...

Então ele disse assim: ___O Ronaldo não está, porque ele se casou no sábado às oito horas. Inclusive eu fui o padrinho dele. Daqui a dez dias, ele estará de volta.

Eu larguei o aparelho e debrucei-me na mesa. Fiquei observando o telefone gangorrar no seu fio, quase tocando o chão. O escritório era no 19º andar, e eu ouvia as buzinas lá embaixo, com um barulho diferente...

Aquele momento foi como um divisor de águas. Existiu uma Maria antes desse telefonema, e outra Maria depois. Apesar da minha essência continuar a mesma, naquele momento eu perdi mais uma vez, a minha fé.

Depois desse silêncio, eu comecei a chorar e corri para o banheiro. As minhas colegas foram atrás de mim, cheias de solidariedade, mas a dor tão doída teve moradia no meu PEITO, durante quase uma década.

17/12/2010






















17/12/2010

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

NASCE UMA PROSTITUTA

NASCE UMA PROSTITUTA

Em outubro de 1981 eu estava grávida de dois meses. Por falta de opção, fui morar outra vez, num pensionato.

Logo que cheguei, conheci a Helenice. Ela era uma linda mocinha de dezoito anos. Trabalhava numa imobiliária, e seu salário era tão pouco, que mal dava para pagar a pensão. Filha de lavradores do interior de Minas Gerais, ela veio para BH, tentando melhorar de vida.

Com sua alegria e criancice, ela nos divertia bastante. Era deslumbrada com a vida, com sua própria beleza, e tudo que o mundo pudesse lhe oferecer.

Num dia ela voltou do trabalho toda radiante, porque havia conhecido um homem de cinquenta anos, atraente e sedutor. Ele era viajante e quando estava em BH, ficava hospedado num hotel na praça Raul Soares.

Começaram a namorar. Um mês depois ele a tirou do emprego e passou a sustenta-la. Quando não estavam juntos, estavam se falando ao telefone, o que durava mais de duas horas.

Helenice era virgem e o namoro foi caminhando de forma respeitosa e conservadora, sem melindrar o seu sonho, que era de só se entregar ao seu homem, depois do casamento.

Dois meses depois, ele se mostrando muito apaixonado, disse que ficariam noivos e dentro de seis meses realizariam o casamento.

Alegando não ter tempo para ir na roça conhecer a família dela, ele preparou a festa de noivado no hotel mesmo, e pediu a dona do pensionato para substituir os pais dela, na hora da cerimônia.

Ela não se continha de tanta felicidade. Alguns dias antes, eles foram num restaurante e depois ele a levou para um motel, convencendo-a de que já que estavam perto de se casarem, não haveria nenhum problema, em anteciparem a lua de mel.

Na manhã seguinte ela chegou muito triste, sentou-se na cama, e mostrava uma grande preocupação. Logo em seguida começou a chorar, dizendo que havia se entregado àquele homem, e tinha medo que ele a abandonasse, e medo de uma possível gravidez.

Chegou o dia do noivado. Era sábado. Durante o dia todo ela cuidou dos seus belos cabelos pretos e longos. Foi no salão de beleza para fazer as unhas; e quando voltou, tomou um banho demorado. Depois colocou um lindo vestido preto, que foi presente do seu amado.

Sua beleza era de fechar o trânsito. Alguém avisou que o cinquentão já estava na porta do prédio, esperando por ela. Helenice desceu aquelas escadas como uma princesa, e foram para o hotel.

As colegas do pensionato já haviam ido primeiro, para ajudarem na decoração do salão de festas. Só eu não fui, porque ficava o dia todo deitada naquela cama beliche, de onde só saía para ir ao banheiro. Os enjoos eram tanto, que eu ficava mais tempo no banheiro, que na cama.

Por volta das vinte e duas horas, todas elas chegaram falando alto e ao mesmo tempo, enquanto a Helenice se desmanchava em lágrimas.

Contaram que, no momento da entrega das alianças, uma senhora idosa entrou apressadamente no salão, dizendo aos berros que era a esposa dele, e que tinham quatro filhos. Disse também que ele tinha vários outros filhos, de um casamento anterior.

Helenice chorou a noite toda. No dia seguinte, ficou calada sobre aquela cama, mas estava pensativa e distante.

No outro dia ela se levantou cedo, conversou como se nada tivesse acontecido, e ficou se maquiando e cuidando dos cabelos.

À tarde, vestiu-se com uma calça branca muito apertada, muito colada no corpo. Colocou uma blusa com um decote imenso, e disse assim:

__Sabem o que vou fazer da minha vida? Vou ser prostituta!

Ficamos espantadas, e cada uma de nós tentava lhe dar conselhos. Ela pegou sua bolsa, foi para a Boate Sagitarius, e só voltou no dia seguinte. O dinheiro que ganhou lá, ela espalhou sobre a cama, como se aquilo fosse um troféu.

O seu vocabulário foi ficando cada vez mais vulgar, e todos os seus assuntos eram sobre sexo. Ela era uma boa menina. Mandava dinheiro para sua família, alegando ter encontrado um emprego que lhe pagava bem.

Aquela rotina foi trazendo muitas doenças venéreas pra ela, o que consumia grande parte do seu dinheiro. Como se não bastasse, ela se apaixonou pelo garçom da boate, que não fez outra coisa senão assedia-la, desde que a conheceu. Ele era casado e tinha filhos.

Ele começou a arranjar-lhe programas com homens de posse, porque uma parte do dinheiro seria a comissão dele. Helenice tornou-se amante desse rapaz.

Ao vê-la ganhar muito, ele começou a dizer que estava com dificuldades financeiras. Cada dia mostrava pra ela uma receita de remédio que ele teria que comprar para seus filhos. Tais medicamentos eram sempre caros. Ela não fazia nenhum questionamento, e dava-lhe mais e mais dinheiro.

Quando chegou a hora do meu filho nascer, eu tive que arrumar outro lugar para morar. Mudei-me dali, mas sempre que podia, ia visita-las.

Numa tarde quando cheguei lá, encontrei-a de malas prontas. É que a mulher do garçom havia descoberto o romance deles, e fez ameaças contra a vida dela.

Com o semblante muito preocupado, ela disse que estava indo prostituir-se em São Paulo. Comentou que lá, além dela ganhar mais dinheiro, teria a chance de esquecer o amor que sentia por aquele sujeito. Aquele... Inescrupuloso, cafetão... Gigolô... Cretino!

08/12/2010

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

PAIXÃO E AMOR

PAIXÃO E AMOR

Minha irmã mais nova quando se mudou para essa cidade, veio junto de seu marido e um casal de filhos. Se instalaram na rua de cima, a dois quarteirões daqui. A menina estava com treze anos de idade, e logo-logo conheceu o seu primeiro e único amor.

Ninguém queria o namoro, porque o rapazinho de quinze anos bebia muito. A paixão deles venceu a oposição, e continuaram o relacionamento. Quando minha sobrinha estava com dezessete anos, eles se casaram e ficaram morando no mesmo endereço dela, numa construção nos fundos da casa.

O rapaz era trabalhador, mas não conseguia ser um bom marido, apesar do grande amor que os uniam. Chegava tarde da noite, continuava bebendo muito, mas a minha sobrinha tolerava tudo em nome do amor, e das promessas que ele lhe fazia, de um dia deixar de lado o vício.

Depois de dez anos de casados, ela resolveu que estava na hora de ter um filho, porque ao fazer dele um pai, a alegria seria tanta, que ele mudaria de comportamento radicalmente. Ela ficou grávida.

Nasceu uma menina linda, mas ele continuou o mesmo. A filha fez um ano no dia 9 de Junho de 2007. A festinha foi num clube, mas ele foi o último a chegar. Ficou ali poucos minutos e logo se retirou.

Naquele tempo, os fins de semana aqui eram marcados por Chacinas constantes, de onde podíamos ouvir gritos de terror. Aí então eu tomava um calmante, porque era impossível desprezar um “tarja preta”.

No dia trinta desse mesmo mês, a noite estava tranquila, o que não era comum. Eu assisti o “Zorra total”, e deixei a TV sem som, enquanto a globo exibia um filme.

Antes da meia noite eu ouvi um tiro... Um grito... Outro tiro, e um latido de cachorro, que durou poucos segundos. Chamei meu filho que já dormia, e lhe contei que esse barulho parecia vir da rua de cima. Nessa noite o calmante não fez efeito, e eu fiquei acordada até o dia clarear.

Na hora do almoço, quando eu e meu filho assistíamos o filme “O Código Da Vinci”, a minha irmã mais velha chegou na porta, e disse que o nosso vizinho contou que na noite anterior, ao passar na Rua de cima, viu um carro do resgate apanhando o corpo dele, que estava estirado na esquina. Aqueles dois tiros o mataram quase na frente da casa deles, mas ninguém ouviu nada, porque já estavam dormindo.

Minha sobrinha já havia se acostumado com o fato dele chegar em casa ao raiar do dia, e a única coisa que ela estranhou, foi que ele deveria passar em casa para tomar banho e ir para o trabalho nesse domingo.

Ficamos decidindo quem iria lá para dar a notícia, e de que forma! Eu, meu filho e meu irmão, fomos pra lá como se fosse uma visita, mas ao chegarmos, eles estavam recebendo a notícia pelo telefone.

Foi terrível. Eu entrei no quarto, e minha sobrinha soluçava na cama, cada vez se encolhendo mais e mais. Com as duas mãos ela puxava os joelhos de encontro ao peito. Parecia um caracol. Ela é alta e esguia, mas a dor era tanta, que ela foi ficando pequena, pequena... Fazendo lembrar um feto.

02/12/2010


(Ele a deixou viúva aos 28 anos, junto da filha de um ano)